domingo, 13 de setembro de 2015

Tributo à Minha Mãe - 2


Lagos, 15 de Junho de 2013

No sábado, dia 25 de Maio, o INEM levou-a para o hospital. No domingo, eu, o neto e a sua mulher fomos lá visitá-la. Começámos a pedir-lhe para ela nos contar dos seus tempos de infância, do que fazia, ...
Então a minha mãe começa a contar-nos dos seus tempos na casa do Visconde de Miranda. Disse-nos ela ”Foram os tempos mais felizes da minha vida. Desde os meus quatro anos até aos onze, quando nasceu o meu irmão, passei praticamente o tempo todo com eles. A minha tia convenceu os meus pais que era melhor estar com eles do que sozinha em casa e eles também assim estariam mais descansados e os meus pais concordaram. Naquela casa da praça Luís de Camões, tive o amor, o carinho, a atenção, a educação do Visconde de Miranda, da sua irmã mais nova, Joanita, que lá vivia, da minha tia, de todos lá da casa.
Sempre que estava sozinha ia para a biblioteca e o visconde ia lá encontrar-me a olhar com muita atenção os livros das estantes, os quadros nas paredes, ... não tocava em nada; não mexia em nada, mas olhava, olhava ... depois, cansada, ia para o balcão que dava para a praça e aí via as pessoas a passar, escutava as suas conversas ... O tempo passava e não dava por isso.
Então o visconde dizia “Emília, estás bem? Ninguém dá pela tua presença. Ninguém te ouve!”
“Estou bem, Senhor Visconde.” respondia-lhe.  
“Anda cá. Senta-te aqui ao pé de mim. Olha, este livro é uma enciclopédia e desfolhava o livro e explicava-me as gravuras; lia-me algumas passagens e dava-me o contexto e eu não dizia nada, mas estava embevecida. Outras vezes eram outros livros de literatura. Outras vezes falava-me dos quadros que tinha nas paredes e contava, contava, contava ... e eu felicíssima escutava e admirava-o ainda mais pelo seu conhecimento. Entretanto vinha a minha tia que se punha a bordar ou fazer crochet e eu acompanhava as conversas; que, com ela, já me sentia mais à vontade para dizer alguma coisa.
Com a irmã do Senhor Visconde aprendi a ler, escrever e os conhecimentos básicos. Ela tinha uma biblioteca particular na área que lhe estava reservada. Quando o meu irmão nasceu e eu passei a estar com os meus pais e a olhar pelo meu irmão, ela emprestou-me muitos livros que eu lia quando os meus pais estavam fora. Todos os bocadinhos que tinha, usava-os a lê-los. Conheci os clássicos portugueses e estrangeiros e os livros que ela achava que me ajudariam na minha educação. Também a ela, lhe devo muito!
Quando havia festa na cidade ou iam a alguma feira, iam sempre à minha casa pedir aos meus pais que me deixassem ir com eles. Na maior parte das vezes, os meus pais permitiam e depois ia um criado da casa buscar-me.
Por tudo isto, digo que a minha infância e adolescência foram as melhores épocas da minha vida.”
Olhámos para ela e acariciámo-la. Ela sorriu. Estava cansada, notava-se, mas estava feliz!
O Visconde de Miranda, engenheiro agrónomo Joaquim Lopo de Miranda, e o seu pai, Custódio José, foram as pessoas que ela mais admirou na sua vida.
Nós despedimo-nos dela e saímos. Também tínhamos já ultrapassado o tempo das visitas.
Não voltou a conversar ou falar; foram aquelas as suas últimas palavras.
Passou a estar cada vez mais sonolenta; passou a estar a soro ... e faleceu passados cinco dias desde que deu entrada no hospital de AVC cerebral. Faleceu na manhãzinha de quinta-feira, dia 30 de Maio de 2013, com 84 anos de idade.
Recebi um telefonema a me informar que ela tinha falecido e dirigi-me ao hospital. Pelo caminho, encontrei uma vizinha que é voluntária no hospital e me disse “A sua mãe morreu tranquila e em paz. Teve uma morte linda”. Consolou-me um pouco. É bom quando assim é. Agradeci-lhe a atenção de me informar; é algo importante.
O Visconde de Miranda era presidente  da Ordem Terceira dos Carmelitas e ele convidou a minha mãe para membro desta Ordem. Aos 17 anos, em 1945, a minha mãe foi convidada para ser Secretária pelo Presidente, Visconde  de Miranda. Quando este faleceu, em 1947, o Movimento ficou sem governo por uns tempos.
Quando o Movimento retomou, em 1950, foi presidente a D. Floripes, cabeleireira, e após o casamento da minha mãe, em 1953, ela aceitou ser Presidente da Ordem Terceira Carmelita em Lagos e desempenhou estas funções de Janeiro de 1954 a Janeiro de 1959, por um mandato.
Em Lagos, havia principalmente a Ordem Terceira Carmelita ligada ao Convento das Carmelitas situado no Largo actualmente designado Largo Dr Vasco Gracias e a Ordem Terceira Franciscana ligada ao Convento Nossa Senhora da Glória, actualmente posto da GNR desde 1910.
Contudo a minha mãe teve outras épocas também muito boas até casar.
Quando o irmão da minha mãe tinha cerca de três anos e ela catorze, ela passou a frequentar a casa da sua madrinha-tia paterna, Margarida Cristina, que tinha três filhas pela idade da minha mãe e um filho que era o mais novo dos quatro. A 08 de Março de 1970, os meus pais foram padrinhos de Baptismo e de Registo de uma criança, para a qual a minha mãe escolheu os nomes Maria Cristina, os dois nomes próprios que a minha mãe sempre dizia que gostaria de ter. Realizou-os na sua afilhada.
A minha mãe costumava contar como era divertida e muito bricalhona esta tia que se assemelhava muito à mãe dela, Cristina da Conceição. Ela animava toda a casa e esta situava-se na rua Infante de Sagres, ao Hospital Velho, em Lagos. A minha mãe, com elas e com a sua mãe, começou a frequentar os bailes no Clube Artístico Lacobrigense, frequentado pela classe média de Lagos. O marido da tia Margarida Cristina era feitor do Visconde de Miranda de uma propriedade situada na área de Santo Amaro. Anos mais tarde, quando tinha 22 anos, a minha mãe conheceu o meu pai num baile neste Clube.
Andava a minha mãe pelos seus vinte e um anos quando a família mudou de casa. A nova casa ficava perto do mar – Porto de Mós. A família adorava aquele lugar. Assim que tinha um tempinho a minha mãe ia à praia com o irmão. Então logo, logo um casal dirigiu-se à minha mãe enquanto o meu tio brincava à beira-mar. A mulher falou com a minha mãe “Somos vizinhas.” disse. A minha mãe ficou meio encabulada “Verdade?” “Sim, moramos mesmo no outro lado da rua. Ele é o engenheiro Vilarinho e eu chamo-me Inês.” A minha mãe respondeu-lhe “Chamo-me Emília e aquele é o meu irmão Joaquim.” e o casal sentou-se ali perto. A D. Inês era muito faladora e falou como gostava de apanhar polvos, safios, moreias, ouriços-do-mar, ... nas marés vivas quando estava baixa-mar. A minha mãe ficou encantada. Era algo que ela não conhecia, mas como sempre, gostaria de aprender; estava sempre pronta para aprender o que não sabia. A D. Inês esclareceu “Eu não sei nadar. Tenho medo, mas para apanhá-los não preciso de me aventurar pelo mar.”  “Eu também não sei nadar, mas gostaria muito de aprender consigo.” “Ótimo, vamos ser grandes companheiras. O Vilarinho não gosta nada de apanhá-los; só comê-los no prato.” “E não é uma boa opção?” Todos se riram.
Sempre que o tempo se proporcionava, a D. Inês ia à casa da minha mãe fazer o convite “Amanhã está bom tempo para irmos pescar. Precisas de te levantar bem cedo. Às 8h 30mn espero por ti na minha casa.” “Combinado.” dizia a minha mãe. “Então amanhã há refeição melhorada cá em casa.” - dizia o meu avô e todos se riam. “Tenho trazido bastante pesca.” afirmava a minha mãe.
Mesmo durante a fase de namoro com o meu pai, seu único namorado, a minha mãe ia à pesca com a D. Inês que passou a ser a sua melhor amiga, apesar da diferença de idades – cerca de vinte anos mais velha. Com o casamento, a minha mãe foi morar para a sua própria casa e não houve mais pescaria, pois passou a ficar longe nem passeios com os Miranda, só umas visitas da minha mãe de vez em quando à sua tia Maria de Miranda “Titi”.
O casamento trouxe uma mudança radical à vida da minha mãe, mesmo de 180º. A minha mãe casou com 24 anos a 04 de Outubro de 1953. 
A minha mãe foi membro do Movimento Apostolado da Oração desde 22 de Agosto de 1993 e membro do Movimento Cruzados de Fátima desde 17 de Outubro de 1993.
 A minha mãe  foi assinante da revista “Família Cristã” desde o ano de 1996.
A minha mãe fez-se assinante do jornal “Correio de Lagos” , n.º 324 de 2012, após o falecimento do meu pai. Ela foi a sócia n.o 743 da Associação dos Bombeiros Voluntários de Lagos. Ela foi uma grande mulher, apesar de tantas adversidades. =



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Os meus filmes

1.º – As Amendoeiras em Flor e o Corridinho Algarvio.wmv           http://www.youtube.com/watch?v=NtaRei5qj9M&feature=youtu.be
2.º – O Cemitério de Lagos
3.º – Lagos e a sua Costa Dourada


4.º – Natal de 2012

Os meus blogues

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